A falta da certidão de óbito e o reconhecimento da cidadania italiana

Uma das perguntas mais recorrentes no mundo da cidadania italiana é: “é realmente necessário apresentar a certidão de óbito de meus ascendentes?”.

Como eu sempre digo, a legislação que regula o reconhecimento da cidadania italiana é lacunosa e ambígua e nesta questão não é diferente.

Eu particularmente não vejo nenhum mal em solicitar a certidão de óbito, mas exigi-la sob pena de não reconhecer a cidadania de um descendente fere frontalmente o princípio da razoabilidade, demonstrando claramente que quando isso acontece pratica-se o obstrucionismo (ainda farei um artigo específico sobre isso).

Qualquer pessoa que entenda como se dá a transmissão da cidadania italiana pode afirmar claramente que é flagrantemente contra legem negar o reconhecimento da cidadania italiana devido à falta de uma certidão de óbito de um ascendente.

O motivo é bastante simples: o evento do óbito de um ascendente não tem qualquer influência na transmissão da cidadania a seu filho ou a sua filha. A única e raríssima exceção é quando não há nenhum outro documento que comprove que o dante causa morreu após a formação do Reino da Itália. São situações absolutamente raras, em mais de 20 anos de estrada vi apenas um caso.)

Não há nenhuma mísera linha de qualquer lei ou normativa que estabeleça a obrigatoriedade da apresentação da certidão de óbito. E é simplesmente absurdo que consulados e municípios italianos não aceitem pedidos de cidadania apenas por este fato.

Contando uma história pessoal, eu consigo sentir um pouco da angústia causada por essa exigência ilegal e irrazoável. Meu bisavô Augusto, pai da minha avó paterna, nasceu em 1905, casou-se em 1927, minha avó nasceu em 1929 e meu pai em 1949. Se minha cidadania dependesse dele (não foi o caso), ele seria o meu dante causa. Só que haveria um problema: ele era alcoolista e acabou por abandonar a família e “sumiu no mundo”. Já tenho os antepassados dele na minha árvore genealógica até o século XVI, mas até hoje nunca achei seu registro de óbito. Possivelmente ele morreu como indigente e foi sepultado como um anônimo.

Provavelmente a maioria dos consulados negaria meu pedido porque eu não poderia apresentar o óbito dele. Isso é de um absurdo que me tira do sério. É injusto e denota o exercício de pequenos poderes de forma ilegal.

Mas, então, o que fazer quando nos vemos diante de uma negativa injusta e ilegal devido à falta de uma certidão de óbito?

Como eu afirmei no artigo “Requerimentos feitos à administração pública italiana: os nossos direitos” (recomendo a leitura), todo pedido feito a uma repartição pública italiana deve ser respondidos por escrito.

Jamais aceitem negativas “de boca”, seja por telefone, e-mail ou pessoalmente. É dever do funcionário consular entregar ao requerente de um serviço uma negativa por escrito explicitando os motivos da recusa (em italiano “rigetto” ou “diniego”).

A lei determina (cito abaixo as referências) que em caso de resposta negativa, o consulado (ou comune) deve enviar/entregar ao requerente do serviço um preavviso di rigetto (ou di diniego). A partir do recebimento do preavviso o cidadão tem dez dias para apresentar por escrito suas observações e outros eventuais documentos complementares para sanar o que foi assinalado.

Se o cidadão não apresentar suas razões, o consulado (ou comune) deverá emitir um provvedimento di diniego no qual deve elencar os motivos que fundamentam aquela negativa, citando a normativa pertinente ao caso. Caso o cidadão apresente suas razões e mesmo assim o consulado (ou comune) decida negar, há igualmente a obrigação de apresentar o “provvedimento di diniego” por escrito e fundamentado.

Quando o cidadão demonstra que defenderá seus direitos até as últimas consequências o comportamento dos agentes públicos costuma mudar da água para o vinho.

É muito fácil negar “de boca” (lembrem-se “verba volant, scripta manent“) e ver que o interessado simplesmente vira as costas e vai-se embora. É a vitória da acídia e da inépcia. Nunca permitamos que nos tratem assim!

Referências

– Art. 10-bis Legge n. 241 del 1990
– Art. 6 Legge 11 febbraio 2005 n. 15
– Art. 9 comma 3 Legge 11 novembre 2011, n. 180

Meu conselho

Como eu digo repetidamente há anos, quase sempre o “não encontrei” ou o “não encontramos” são frutos de uma pesquisa mal feita, ou seja, o registro de óbito – no caso – existe, mas não é encontrado por diversos motivos. Portanto, antes de pensar em “brigar” com consulados e afins, faça de tudo para encontrar o registro de óbito de que precisa.

Para tanto, recomendo que leia meus artigos a seguir e faça uma pesquisa como deve ser feita:


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