Cidadania não pode ser loteria!

As filas fantasmas da cidadania dos consulados do Rio de Janeiro e Belo Horizonte

No Brasil há hoje sete representações consulares de primeira categoria no Brasil:

  1. Consulado-Geral em São Paulo
  2. Consulado-Geral em Curitiba
  3. Consulado-Geral em Porto Alegre
  4. Consulado-Geral em Rio de Janeiro
  5. Consulado em Belo Horizonte
  6. Consulado no Recife
  7. Embaixada em Brasília (chancelaria consular)

A chancelaria consular em Brasília não é propriamente um consulado, mas para facilitar a leitura do texto vou tratá-la desta forma.

Desses sete consulados, cinco têm filas “tradicionais” para o pedido de reconhecimento da cidadania italiana e dois têm “filas virtuais” (Rio de Janeiro e Belo Horizonte).

Quando existe a fila tradicional, o interessado envia uma ficha de requerimento (uma para cada maior de idade) ao consulado  e com esse pedido a pessoa ingressa na fila de espera do consulado.

Para a Legge 241/1990, essa ficha de requerimento equivale ao que se denomina “istanza” e é considerada uma “iniziativa di parte“. Na prática o que isso significa? Que os prazos decorrem a partir da data que a “istanza” é apresentada ao consulado (e não quando o consulado convoca o requerente).

Isso está claramente definido na Lei nº 241 de 7/8/1990 Art. 2 § 6 – “Nuove norme sul procedimento amministrativo”: “I termini per la conclusione del procedimento decorrono dall’inizio del procedimento d’ufficio o dal ricevimento della domanda, se il procedimento è ad iniziativa di parte.

Já abordei essa questão noutros artigos. Quero falar aqui sobre as “filas virtuais” que os consulados do Rio de Janeiro e Belo Horizonte criaram e que, creio não tardará, a Embaixada em Brasília também criará.

Esses consulados em dado momento “zeraram” a fila e a partir de uma data passaram a aceitar pedidos de cidadania apenas pelo sistema PRENOTA ONLINE. Sendo assim, o consulado estabelece quantos reconhecimentos de cidadania consegue fazer num dia e impõe limitações de vagas aos requerentes.

Na verdade, não se cria apenas uma fila virtual, mas sim uma LOTERIA DA CIDADANIA! E por quê? Porque sempre haverá mais requerentes do que vagas e esses interessados deverão disputar num ambiente virtual as vagas disponibilizadas.

E qual é o nome que se dá ao processo em que muitos interessados disputam um bem escasso que apenas poucos poderão receber? Ora, chama-se sorteio, rifa, tômbola, bingo ou… LOTERIA.

Pois é isso que os sistemas de agendamento online dos consulados fazem. Sorteiam entre felizardos a oportunidade de apresentar um pedido de cidadania por direito de sangue.

Foi criada então a “CITTADINANZA A NUMERO CHIUSO“. O consulado sorteia turnos para reconhecimento de cidadania, admitindo que não pode atender mais gente além do número que ele próprio estabelece como limite usando parâmetros a que o público não tem acesso.

Não há transparência nenhuma quanto a número de vagas, desistências, nada. É como se a Mega-Sena fosse sorteada dentro da sala do presidente da Caixa Econômica Federal com a presença apenas dos seus funcionários mais fiéis.

O estabelecimento de quotas máximas de reconhecimento de cidadania italiana é simplesmente ILEGAL.

O Estado italiano, representado no Brasil por cada um dos sete consulados, não pode limitar o acesso ao reconhecimento da cidadania que é um direito do cidadão que já nasceu italiano.

É simplesmente indigno escravizar pessoas por meses a fio atrás de um computador para disputar vagas para o reconhecimento da cidadania. O cidadão tem o direito de apresentar o seu pedido de cidadania sem ter de se sacrificar por meses e meses à espera de uma vaga que talvez nunca chegue.

Dizer que o sistema funciona porque “há gente que consegue” é um escárnio. Toda loteria tem um vencedor! Mas cidadania não pode ser loteria! Jamais!

Muitas pessoas me procuram dizendo que estão há meses em busca de um agendamento. Algumas estão há mais de um ano tentando um vaga no consulado do Rio de Janeiro. É uma situação inaceitável.

Não acreditem no factoide de que a culpa dessa situação é de uma suposta “máfia do agendamento”. Isso é uma mentira. A culpa é do consulado e do Ministério que permitem que essa situação vergonhosa aconteça. O problema não são os “agendadores”, mas sim a falta de vagas suficientes para suprir a demanda.

E o que pode ser feito?

1) Registre todas as tentativas feitas no sistema. Uma a uma, com horário e print das telas. Dia após dia.

2) Depois de mais de umas 30 tentativas, escreva uma carta em italiano ao Consulado solicitando uma vaga para que você possa apresentar o seu pedido. A carta deve ser registrada com A/R ou enviada por PEC (posta elettronica certificata) ao consulado. O consulado provavelmente não responderá, mas você terá uma prova de que enviou o pedido.

3) Agora você tem duas alternativas: acione todas as instâncias superiores contra esse absurdo: Embaixada, Ministero degli Affari Esteri, PCM, Procura della Repubblica etc. , o Presidente della Repubblica Italiana…

ou, se tiver condições financeiras, processe o Estado italiano.

A primeira alternativa dificilmente surtirá efeitos, mas será o que te resta se não tiver como pagar um advogado italiano.

A segunda alternativa infelizmente não é barata, mas os custos podem ser divididos entre vários membros da família interessados. Infelizmente, essa é a única forma efetiva de enfrentar esse absurdo.

A tendência é que assim que conseguirem resolver a fila em curso, todos os outros consulados adotem o agendamento online, pois é uma forma muito eficiente de represar a demanda de reconhecimento da cidadania, pois infelizmente muita gente se resigna e acha que não há alternativas. E cada vez que alguém diz “o Consulado do Rio de Janeiro não tem filas! É o mais rápido do Brasil” significa que eles venceram a batalha psicológica e de opinião pública.

Nunca se resignem diante de desmandos da burocracia. A lei está do nosso lado.


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