Afinal, o que é esse tal de “obstrucionismo”?

Ao ser indagado por e-mail ou pelas redes sociais sobre como solucionar um problema que um cidadão está enfrentado ao ter de lidar com uma repartição pública italiana (consulado ou comune) eu respondo que o funcionário responsável (ou mais de um) está praticando “obstrucionismo” (em italiano “ostruzionismo“).

Muitas pessoas não entendem bem o que é esse tal de “obstrucionismo”. Então explico a seguir.

OBSTRUCIONISMO é qualquer ação que pretenda criar obstáculos de forma proposital, deliberada e sistemática para que determinado objetivo não seja alcançado ou que seja alcançado após muita dificuldade.

No caso da administração pública italiana, o obstrucionismo é um esporte nacional. A Itália é um país maravilhoso por tantas de suas qualidades: seu patrimônio cultural inigualável, sua gente, sua gastronomia, sua natureza, seu patrimônio cultural, entre tantas inúmeras qualidades. Como não amar a Itália?! Todavia, a burocracia italiana é de dar calafrios.

Salvo raras exceções, o funcionário público italiano é um obstrucionista atávico. Os motivos são variados, ora porque não quer executar determinada tarefa por simples falta de vontade, ora porque considera em seu íntimo que aquele cidadão que bate à porta de sua repartição não é merecedor do serviço que está solicitando. E por tantos outros motivos.

No mundo da cidadania italiana o obstrucionismo é pane quotidiano, ou seja, um “item” do dia-a-dia. Encontra-se obstrucionismo em todo lugar e a todo momento. Os consulados inventam regras que não têm base legal. Oficiais de registro civil na Itália inventam normas e leis inexistentes para tornar a vida do cidadão um inferno e se ver obrigado a desistir ou contratar um advogado italiano que faça o funcionário cumprir simples determinações legais.

E o que fazer para enfrentar práticas obstrucionistas? A melhor estratégia será sempre a diplomacia e o pragmatismo. Tratar o funcionário com educação e respeito, tentando fazê-lo entender que você necessita aquele serviço e que as normas e leis asseguram seu direito a ele. Raramente reações exasperadas surtem efeito.

É preciso ter em mente o conceito do “pequeno poder”. Muitos funcionários públicos, numa relação pouco saudável com o público, acabam num mecanismo mental perverso obtendo uma satisfação mórbida em criar problemas para as pessoas. Ele ou ela sentem, meio sem se dar conta de forma consciente, que têm naquele momento a vida de uma pessoa em suas mãos, o que lhes dá alguma sensação prazerosa de poder e quando mais isso se prolongar mais satisfação terão. Cria-se o círculo vicioso do pequeno poder. Esse tipo de situação anômala só ocorre quando o funcionário público sabe que o cidadão é hipossuficiente, ou seja, tem grandes dificuldades para poder se defender ou obter a ajuda de um advogado que o defenda.

Contudo, na maior parte das vezes não creio que o obstrucionismo seja imputável ao exercício puro do pequeno poder, mas sim à corriqueira vontade de não ter de executar um determinado serviço. Então cria-se um obstáculo qualquer, vale qualquer desculpa que estiver disponível, para não ter de executar um serviço e tentar dissuadir o cidadão para que ele desista totalmente do serviço de que necessita ou que simplesmente tente fazer noutro lugar ou noutro momento. Quando isso acontece o funcionário público “vence”, porque afasta o cidadão e, moto contínuo, livra-se do serviço que cairia no colo dele.

Essa mentalidade muito comum na administração pública italiana é um atraso para o país. A Itália precisaria de uma “intervenção coletiva” para tentar se livrar deste mal. O obstrucionismo cria cidadãos insatisfeitos que não conseguem ter confiança nos entes estatais, cria quase sempre um retrabalho, porque o cidadão cedo ou tarde precisará daquele serviço, então o que se resolveria numa única execução passa a requerer diversas etapas de tentativas e frustrações absolutamente desnecessárias. Todos perdem. Perde-se tempo, dinheiro, saúde, boa vontade… é um círculo vicioso altamente prejudicial para a sociedade.

Obviamente, o Brasil padece desse mesmo mal, em gradações diferentes. Eu quis aqui expor a situação que vejo na administração pública italiana.

Voltando às possibilidades de resolução, se a diplomacia não obtiver êxito, tente pleitear por escrito que seu direito seja respeitado. Sempre numa carta escrita em bom italiano, fundamentando sua solicitação (em italiano “istanza“) e solicitando uma resposta por escrito. Para tal, veja meu post sobre a obrigatoriedade existente na administração pública de negar solicitações sempre por escrito fundamentando a decisão em normas e leis.

Por fim, se nada funcionar, será necessário contratar um advogado italiano que possa defender seus direitos. Infelizmente, isso significará um gasto considerável com honorários advocatícios.


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